quarta-feira, 24 de agosto de 2011

"Ficava desesperado porque não sabia o que aquele olhar queria dizer. Algo entre a indiferença e o desespero, pensava ele. Não sabia que há lugares, como o país donde Rahel vinha, onde vários tipos de desespero competem pela primazia. E que o desespero pessoal nunca poderá ser suficientemente desesperado. Que acontecia algo quando o tumulto pessoal passava pelo santuário da beira da estrada dedicado ao tumulto vasto, violento, envolvente, impulsionador, ridículo, insano, inverosímil e público de uma nação. Que o Grande Deus uivava como um vento quente e exigia obediência. Depois o Pequeno Deus (caseiro e contido, privado e limitado) saía de lá queimado, rindo-se entorpecidamente da sua temeridade. Endurecido pela confirmação da sua própria insignificância, tornava-se resistente e verdadeiramente indiferente. Nada importava muito. Pouco ou nada importava. E quanto menos importava, menos importava. Nunca era suficientemente importante. Porque Coisas Piores tinham acontecido. No país donde ela vinha, oscilando eternamente entre o terror da guerra e o horror da paz estavam sempre a acontecer Coisas Piores."

Arundhati Roy, "O Deus das Pequenas Coisas"